Para refletir!

"Cada dia a natureza produz o suficiente para nossa carência. Se cada um tomasse o que lhe fosse necessário, não havia pobreza no mundo e ninguém morreria de fome". Mahatma Gandhi

O Barco do Avô

Pensamento: “Antes de começar o trabalho de mudar o mundo, dê três voltas dentro de sua casa.” Provérbio Chinês
Mensagem: O Barco do Avô
Marisa vivia com a mãe e o avô numa casinha com vista para o mar. O avô era pescador e navegava no seu barquinho, que tinha uma vela castanha, pelas águas do porto.
Umas vezes, o avô pescava perto da costa e Marisa gostava de ver o barquinho serpentear por entre as rochas e as enseadas da baía. Noutras, partia ao cair da noite e então Marisa ficava a ver o barco embrenhar-se no vermelho dourado do crepúsculo. A seguir ia para a cama, satisfeita por saber que, quando o Sol despertasse por detrás dos montes, veria a vela castanha regressar à luz tênue da aurora. Quando isso acontecia, Marisa e a mãe desciam até à ponta do molhe para se despedirem dele com grandes acenos, e o barco, levado pelo movimento da maré, mergulhava na neblina do horizonte, parecendo afundar-se naquela imensidão de onde apenas emergia a ponta do seu mastro. Depois, quando o próprio mastro desaparecia, Maria e a mãe ficavam completamente sós.
— Ele vai voltar — prometia-lhe sempre a mãe. Por vezes, Marisa até sabia em que maré ele iria regressar, e nessas alturas corria para o cimo do monte que ficava por detrás da casa e não tirava os olhos do mar até a ponta do mastro surgir no horizonte.
— Vem aí o vovô, vem aí o vovô!
— gritava entusiasmada.
Então, ela e a mãe corriam para a ponta do molhe para acenarem para o barco cuja vela castanha se agitava cada vez mais perto até que, por fim, tornavam a ver a cara sorridente do avô. Também havia alturas em que os dias passavam sem ele voltar, o que deixava a mãe de Marisa muito preocupada:
- Estamos na época das tempestades e o vovô pode ainda demorar sabe-se lá quanto tempo.
— Explicava Marisa. No entanto, continuava à espera de o ver regressar.
- Se a viagem foi perigosa, o vovô ainda estará mais ansioso por nos ver - dizia.
Marisa aprendeu a reconhecer quando a maré estava alta, pois era a altura mais propícia para o barco entrar no porto. Era então que ia à procura dele. Chegava a passar uma semana à espera ou mesmo duas... Mas acontecia sempre o mastro aparecer e o avô voltar.
- Às vezes desejo que o vovô não saia para o mar para não nos deixar sozinhas - disse-lhe Marisa após uma viagem que tinha durado vários dias.
- Vou fazer a tua vontade - suspirou o velho. Já não sou tão forte como era dantes e por isso não me atrevo a ir para tão longe como costumava. A partir de agora não me afastarei muito... Ando de cá para lá e de lá para cá durante o dia, enquanto a maré me ajudar.
De início, Marisa ficou satisfeita porque assim tinha mais tempo para estar com o avô. Porém, reparou que, a cada dia, o avô estava cada vez mais frágil e debilitado, e quase já não saía de casa.
- Vovô, você já não vai mais para o mar? - perguntou Marisa ansiosa.
- O único barco em que eu agora irei navegar é o que me levará para o outro mundo
- respondeu o avô a sorrir. Marisa suplicou-lhe:
- Não vá! Nunca vá para lá! - disse-lhe chorando.
- Essa é a viagem para que eu sempre vivi - respondeu-lhe serenamente o avô
- Explorei tudo o que me apeteceu neste mundo e agora anseio por descobrir o outro.
Pouco tempo depois o avô de Marisa morreu. O sino da igreja da vila repicou solenemente quando o enterraram no cemitério que dava para o mar.
- Adeus, vovô - sussurrou Marisa à terra escura.
A seguir correu sozinha para a ponta do molhe.
-Adeus, vovô - gritou à maré que baixava rapidamente.
- Adeus, adeus.
As águas foram-se afastando da costa e ela permaneceu à espera, tanto tempo quanto o barco do avô costumava levar até desaparecer no horizonte longínquo. Entretanto, chegou à mãe que se sentou a seu lado.
- Já não o podemos ver - disse tristemente a mãe - Mas creio que numa costa distante, numa outra terra, haverá alguém que o estará aguardando chegar.
 
Lois Rock (org.) / Contos e Lendas da tradição cristã / Lisboa, Editorial Verbo, 2006
Programa exibido em 02/09/11!

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